destacar, no entanto, que quando falamos de cultura aqui a tomamos no seu sentido lato sensu
e não stricto sensu. Entendemos sim que cultura é um conceito amplo que representa o conjunto
de tradições, crenças, costumes, práticas de determinado grupo social, como a soma de padrões
de comportamentos humanos e que envolve conhecimentos, experiências, atitudes, valores,
religiões, línguas, estrutura social, noção de tempo, conceitos de universo... Como afirma Stuart
Hall (2016), cultura é um sistema de representação, um conjunto de significados compartilhados
em uma sociedade que são produzidos e transmitidos por meio da linguagem e de diversos
outros símbolos. Não é, portanto, apenas um conjunto de valores, tradições e costumes estáticos,
mas um processo dinâmico e fluido de produção e interpretação de significados, que molda as
práticas sociais e as relações de poder. A linguagem é, portanto, “um dos ‘meios’ através do
qual pensamentos, ideias e sentimentos são representados numa cultura” (Hall, 2016: 18).
Mas aqui abordamos o conceito de cultura apenas como uma prática comum a um nicho social,
um grupo específico de pessoas que partilham interesses, necessidades, características e
comportamentos semelhantes, como práticas corporais, vestuário, linguagem, visões de mundo,
sentidos de tribo, conforme explica Maffesoli (2014): são grupos de pessoas que se unem por
interesses comuns, hábitos, ideias, gostos estéticos ou musicais, que os distinguem de estruturas
sociais mais amplas e impessoais. Podemos dizer, então, que cultura aqui sintetiza o modo de
ser dessa tribo urbana.
O mesmo ocorre quando tratarmos de arte, que a entendemos sim como uma manifestação
humana marcada pela expressão da criatividade, tradicionalmente por meio da música, dança,
pintura, escultura, teatro, literatura, cinema... É uma forma de comunicar ideias, emoções e
experiências por meios que buscam transmitir uma mensagem estética, conceitual. Para Walter
Benjamin (1936), a arte não é meramente uma forma de linguagem ou expressão, mas um
espaço onde a verdade é preservada e a memória é perpetuada. A obra de arte, para ele, possui
uma ‘aura’, um caráter único e inseparável do seu contexto histórico e do ‘aqui e agora’ da sua
criação. Contudo, tomamos aqui a arte especialmente para diferenciar duas práticas de skate, a
do esporte e a da expressão de criatividade pessoal e coletiva no âmbito do skate. A diferença,
portanto, reside na natureza e finalidade do esporte e da arte.
O esporte é uma atividade prática, geralmente com regras e objetivos, que busca conquista de
resultados por meio da competição. Já a arte é uma forma de expressão criativa e subjetiva, que
visa a comunicação de emoções, ideias e experiências por diferentes meios. Claro que as duas
áreas podem se interligar e influenciar-se mutuamente, mas aqui buscamos fixar nossa reflexão
em torno da prática do skate genuinamente como expressão criativa não competitiva. Trata-se,
portanto, de explicitar expressões criativas individuais de equilíbrio sobre rodas vencendo
obstáculos urbanos, numa forma de subversão desses espaços arredios a um modo de não
mobilidade humana. Eis, portanto, o papel da arte como uma ferramenta de reflexão e pugnando
por mudança social. Se há uma competição aqui não é entre indivíduos, mas entre o humano e
o ambiente, criado por humanos.
Portanto, tomamos o skate como manifestação artístico-cultural, fugindo do paradigma do skate
como esporte, como vem sendo difundido especialmente ao se tornar um esporte olímpico, para
vê-lo como um “elemento de expressão sociocultural que possui grande influência na cultura
da juventude urbana contemporânea” (Dias, 2011: 10).